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Há vida na dor inominável

Júlia Jones – IPB

Chico Buarque, que desde o início da sua carreira se manteve atento aos efeitos dos afetos nos sujeitos em suas relações amorosas, políticas e sociais, utiliza a arte para prestar uma homenagem a Zuzu Angel. Zuzu, que era uma ativista contra a ditadura militar no Brasil e já reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho com moda, passou a se ocupar da procura do seu filho, Stuart Jones, que, por muitos anos, foi noticiado como desaparecido.

Ainda são muitas as mães que têm seus filhos brutalmente assassinados em ditaduras militares. Elas se deparam com uma posição inominável e com o corpo afetado pela tristeza, que, enquanto uma das paixões da alma, é apontada por Lacan1 como um saber falido. Ele coloca a tristeza em oposição ao bem-dizer, modalidade de gozo desarticulada do Outro. Frente àquilo que falta uma nomeação e à solidão desse afeto, o que resta para essas mulheres?

“Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu.”

O que advirei a ser depois de perder a bússola do desejo desse objeto que sai de cena?

Na elaboração do luto, a libido é convocada ao trabalho para que novos investimentos sejam feitos. A arte, compartilhada no âmbito social e sempre frente à sua época, é um lugar possível para novas experiências. Ainda hoje acompanhamos a arte de Chico Buarque com suas composições. Escrita em 1977, “Pedaço de mim” se mantém como um bom recurso para que novos significantes possam emergir e, assim, surgir um saber fazer com a falta desse pedaço de si que foi extraído.


1LACAN, Jacques. Televisão (1974). In: Outros Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.
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