Daphné Leimann
Tradução alemã de Only you – título da famosa canção dos Platters –, Nur du é o título dado ao espetáculo da coreógrafa alemã Pina Bausch em 1997. Declaração de amor. Afirmação de uma versão do amor antigo herdeira do mito de Aristófanes em O banquete, de Platão, o amor consistiria na busca de sua metade perdida e teria sua verdade em uma relação de harmonia ou de “fusão que do dois se faz um”[1], nas palavras de Lacan.
Fracasso do encontro amoroso
E, portanto, os espetáculos de Pina Bausch não param de declinar o fracasso do encontro amoroso. Cada uma de suas coreografias, através do enlaçamento do trágico e do cômico, encarna um impossível no amor. Tentemos apreender algumas tonalidades dessa versão do amor.
Primeiro, a versão trágica. Entre suas primeiras peças, é notável que Pina Bausch desejou dar uma versão coreografada da Ópera de Gluck, Orfeu e Eurídice. Tendo se tornado clássica e entrado no repertório da Ópera de Paris em 2005, a peça encarnou a modernidade da coreógrafa em 1975. Três dançarinos, acompanhados de seus duplos vocais, interpretam Orfeu, Eurídice e Amor, em uma composição em quatro quadros: luto, violência, paz e morte. O amor se aproxima, então, da morte. A peça tenta dizer algo do impossível do encontro entre os amantes. A efígie da esposa à esquerda da cena, no primeiro ato, é inesquecível. Essa noiva em vestido branco de tamanho gigante, com um buquê de rosas vermelhas sobre os joelhos, é a testemunha petrificada dos movimentos do amor que se desenvolvem na cena. Dessa figura imponente, jorra um brilho singular. Essa noiva desmedida convoca, em cada um, um insuportável, talvez o do encontro com A mulher, cujo enigma é nomeado pela famosa fórmula lacaniana “A mulher não existe”[2]. O último quadro, o da segunda morte, é memorável também. Orfeu está revestido com uma meia cor de pele, Eurídice veste agora um vestido escarlate. Alternam-se duos e solos, os dançarinos dão vida à palpitação do desejo. E ressoando com este olhar da noiva petrificada da cena das núpcias, na beleza do quadro, é a voz que reordena as imagens, pois, após a troca de olhares, Orfeu é separado não apenas de sua amada, mas de sua própria voz neste achado de encenação, dando a cada dançarino um duplo vocal. Quando o célebre ar vocal “Eu perdi minha Eurídice” se eleva, o dançarino torna-se quase invisível, escondido contra a parede do fundo da decoração, seu corpo desaparecendo sob a dor do segundo luto. De Orfeu, resta apenas a voz, cujo brilho jorra sobre a cantora da ópera, duplo vocal inclinado sobre Eurídice, que é, ela, reduzida a um corpo caído sem voz. Impossível encontro do outro, resta em cena apenas o Um. O final reúne, no entanto, sem reunir todos os dançarinos do coral em procissão fúnebre. A celebração do amor finaliza-se em um desfile em que os dançarinos se separam um a um.
Em seguida, vem o tempo das criações. Aí, as invenções do discurso amoroso próprio a Pina Bausch ainda serão preciosas. Assim, do Café Müller, criado em 1978, serão memoráveis os solos de Pina Bausch dançando de olhos fechados à música de Purcell. Uma mulher se dá, então, a ver com os traços de desorientação e de solidão. Mas o encontro com o outro sexo toma a aparência de burlesco. Um dançarino tenta operar uma aproximação dos corpos entre um homem e uma mulher, tomados em uma mecânica que não cessa de repetir a falha do seu encontro. Testemunha de uma época que quer varrer as ilusões, fingir não ser mais tolo do amor e reivindicar a liberdade sexual, a coreógrafa coloca em cena o que sobra dessa operação de desconstrução dos semblantes do amor: o isolamento dos seres perdidos.
Em outras peças, ainda, os elementos naturais transportados à cena serão os únicos parceiros dos corpos solitários. Em Vollmond, por exemplo, mesmo quando a cena acolhe vários dançarinos, cada um deles permanece preso em uma dança com a água. Em Danzón, é a terra que é a única parceira do doloroso solo de Dominique Mercy acompanhando a voz de Maria Callas. A esta versão trágica se mistura o cômico do encontro amoroso. Disto, uma cena de Vollmond é exemplar: uma mulher fatal mostra um largo sorriso enquanto ela coloca água no saco transparente onde um homem mergulhou a cabeça.
O amor de Pina Bausch
No entanto, o teatro dançado de Pina Bausch não acontece sem amor[3]. Numerosos são os momentos em que são inventados com o parceiro um modo de encontro sutil e incomparável a cada outro. É o caso do último duo de Orfeu e Eurídice. O amor de Pina Bausch é também o da coreógrafa por cada dançarino e por seu público, que ela vinha saudar a cada representação por sua companhia. Amor sensível em seu método caracterizado por uma atenção ao que faz o mais singular de cada um. Durante a elaboração de suas criações, Pina Bausch trabalha a partir das experiências suscitadas em seus dançarinos. Por exemplo, no documentário Un jour Pina m’a demandé[4], um de seus dançarinos testemunha: um dia, “Pina chegou ao ensaio e perguntou [a eles]: ‘O que vêm a vocês quando eu digo a palavra amor?’”. A esta questão, cada um respondeu de maneira singular: “o amor vem e vai; neste momento, ele se vai”, respondeu um deles. Enquanto um outro se confiou: “na maior parte do tempo, o amor é um fracasso, mas eu tento de novo a cada vez”. Uma terceira dizia: “que o amor se diz Aï(e) em japonês”.
Esse amor da coreógrafa por seus dançarinos pode ser identificado até seu último trabalho, restituído no filme Rêves dansants, em que ela toma cuidado para evitar toda forçagem no encontro dos adolescentes para quem ela prepara uma nova versão de Kontakthof. Amor que os dançarinos testemunham em retorno, como com o dançarino estrelado Stéphane Bullion. Homenageando sua experiência subjetiva nascida de seu encontro com a coreografia de Pina Bausch, ele podia dizer: “A gente não dança O lago dos cisnes há vinte anos como há trinta e cinco anos, porque, nesse meio tempo, a gente terá dançado Orfeu e Eurídice”[5].